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Entre deuses e demônios

Nascido Jacob Kurtzberg em 28 de agosto de 1917, na baixa zona leste de Nova Iorque, Jack Kirby quase sucumbiu à pneumonia quando garoto. Escapou da morte, dizem, devido à intervenção de rabinos exorcistas, que, literalmente, botaram o capeta pra correr do corpo daquele garotinho, filho de imigrantes judeus.

Tal experiência o marcaria profundamente, tanto em nível pessoal, quanto profissional. De acordo com o biógrafo Roy Wyman “a vida de Kirby foi tomada pelo misticismo da fé e da superstição”, o que pode ser denotado em boa parte de seus trabalhos de caráter autoral, como Novos Deuses, Eternos, Etrigan o Demônio, e, até mesmo – por que, não? – em O Incrível Hulk (da parceria com Stan Lee), uma mistura literária e macabra de Frankenstein com O Médico e o Monstro.

Até hoje muitos me perguntam por que Jack Kirby é conhecido como o “Rei dos Quadrinhos”. Que teria feito ele, assim, de tão especial para receber tamanha honraria? A melhor resposta continua sendo o seu – praticamente – imensurável corpo de trabalho. Seu apelido, “Rei” foi dado por ninguém menos que Stan Lee, o cara mais importante dos Quadrinhos americanos no século 20 (de acordo com os leitores da Comic Buyers’ Guide, e de um monte de gente que não tem coragem de admitir isso), o que só confirma a magnitude de sua obra.

Uma pessoa com o mínimo de bom senso e conhecimento das técnicas de linguagem dos Quadrinhos perceberá que a narrativa visual de Kirby é algo que pulsante e soberbo (!), e que seus personagens exagerados são mais do que perfeitamente plausíveis dentro do espaço limitado de uma folha de papel.

Já para o leigo, bastará uma olhada em qualquer uma de suas páginas para, instintivamente, maravilhar-se com seu visual acachapante e conceitos delirantes – produtos de uma mente genial sem par, acima ou abaixo da linha equatorial.

Ele não criou o Homem-Aranha, não teve a idéia de lançar o Quarteto Fantástico, não escrevia bem como seus parceiros, e tampouco desenhou o uniforme original do Capitão América. Ainda assim, seu nome é reverenciado em todo o comicdom, sendo considerado o mais prolífico e influente dos desenhistas, o mais criativo dos autores, e o único talento da indústria das HQs sem concorrência.

O Rei se foi em fevereiro 1994, mas sua obra ainda perdura nos melhores gibis perto de você.

Tá falado!

© Copyright Roberto Guedes. Todos os direitos reservados.

Comentários

Daniel HDR disse…
Guedes, eu sou fã do Kirby!
E adorei o artigo!
Vc permite a publicação do mesmo no site do Curso do estúdio?
É www.cursodequadrinhos.com.br, e os devidos créditos e links serão feitos :)


Abraços,
e Kirby é Rei!
Inter-HQ disse…
Vai escrever bem lá na casa do chapéu, cara!

Eu gostaria, por um segundo, de ser uma estrela para poder ser alvo de suas críticas (positivas, é claro! hihihi)

Aquele parágrafo em que vc fala sobre aquilo que Kirby não fez diretamente, mas que, ainda assim, é considerado talentoso e único, me fez lembrar um autor brasileiro que admiro e que possui as mesmas caracteristicas. Chama-se Roberto Guedes, conhece? rsrs

Parabéns pelo texto, prezado escriba.

Muito bem escrito!
André Valle disse…
Ótimo texto, Guedes. Kirby é daqueles desenhistas com estilo marcante, e é amar ou odiar. Porém, mesmo quem não aprecia seu traço deve reconhecer sua importância, até na influência que fez em artistas como Bruce Timm, Ron Frenz e Steve Rude. Ah, não sabia que o uniforme do Capitão América não havia sido bolado por ele - portanto foi pelo Joe Simon, certo?
Roberto Guedes disse…
Isso mesmo, Valle! Foi Simon quem bolou a vestimenta do bandeiroso.
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Inter-HQ, deixa disso! Mas aprecio a comparação desproporcional com Rei Kirby. (rs)
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Daniel, fique à vontade, chapa!

Abraços!
Anônimo disse…
Confesso que numa das primeiras vezes que vi desenhos do Kirby - e do Ditko também - os achei meio estranhos.
Mas essa impressão logo passou e toda a força do traço, do movimento e entusiasmo que as figuras kirbyanas nos passa ficou marcada.

O véio Jacob matava a pau! (it's clobbering time!)
Supermerecida a alcunha de REI!

A única ressalva era seu gênio irrascivel, o que me faz o ver como um grande malagradecido. Enfim, uma pena. Um desdouro em sua biografia.

Belo texto GUEDES...

André Portocarero
Bela matéria sobre o querido, velho, bom e saudoso Jack, Guedes!
Só uma ressalva, Jack e Stan não se tornaram importantes apenas por causa dos super-heróis. Na verdade, eles ressuscitaram o falido mercado americano fazendo HQs de Terror, de amor, ficção, etc.
Acho muito estranho, pois raramente todos só se referem a eles em relação de super-heróis.
De retso, beleza, bengala brother!
Muito sucesso nesse seu novo livro,
pela Kalako!
Roberto Guedes disse…
Está um pouco desinformado, Tony. Pelo menos em relação ao meu trabalho de pesquisa (que vem de longa data).

Leia o artigo que escrevi sobre Kirby em SENHOR MILAGRE volume 1 (Opera Graphica). Lá há um bom apanhado de todas as fases da carreira do Rei.