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Jerry Siegel, a Disney, os italianos, e a Banca do Mickey

Eu tenho de confessar uma coisa pra você, meu chapa,
mas vê se não espalha, OK? Aliás, prometa que isto ficará entre nós dois, pois se você contar para alguns amigos meus, correrei um sério risco de ser expulso da gangue. Bem, vamos lá:

Eu nunca fui fã da Disney!
Ufa! Falei...

Por favor, não me olhe assim.
Pra quem você está ligando, Cesão?
Guarda esse canivete, Paulão!
Ô, Gérson, desde quando você tem soco inglês?

Tá bom... tá bom... eu sou fã do Morcego Vermelho e gosto muito do Mickey. É sério! Tenho até hoje o manual do camundongo que ganhei do meu pai em 1973. Simpatizo bastante com o Pato Donald também, e até assistia o Clube do Mickey por causa da Kelly Parsons... ops! Quer dizer... por causa dos desenhos, claro.
Além disso, colecionei as figurinhas do Galeria Disney – embora
jamais tenha completado o álbum. Tsc... pura incompetência.

“Também pudera” – como diria o “canalha” Walter Franco –, ou eu colecionava gibis, ou comprava figurinhas, não é? E você sabe, figurinhas são as maiores arquiinimigas dos quadrinhos, desde tempos imemoriais. Eram “elas” que arrebanhavam leitores em potencial para as nossas partidas de “bafo”.

Da minha parte, eu sempre preferi os gibis de super-heróis e os de terror. Foram com eles que comecei a ler quadrinhos: “Sério? Não foi como todo mundo, com Disney ou Mauricio de Sousa?” – perguntou-me Marcio Baraldi certa feita. Hmm... quando vejo esse tipo de reação horrorizada nas pessoas, começo a achar que aquela minha antiga vizinha que me chamava de “Diabo Loiro” não devia estar tão errada assim, afinal de contas.

A única coisa que posso dizer para acalmar os ânimos é que costumava comprar gibis antigos num lugar chamado “Banca do Mickey”, ali no final da rua Silva Bueno, no bairro do Ipiranga. Mas eu não tinha a perspicácia pra sacar que Carl Barks era o cara. Meu negócio era comprar as edições antigas da EBAL: Homem-Aranha, Super X, Capitão Z, Batman, Batman-Bi, Elektron, Superman... ah, falando no kryptoniano, lembro de que, um tempinho atrás, eu postei uma mensagem na lista de bate-papo Classic Disney em que detalhava como seu criador, Jerry Siegel, trabalhou como roteirista para a Disney na Itália. É sério, intrepid one! Siegel perambulou por um monte de lugar além dos corredores da DC – até mesmo pra Marvel, o paizão de Clark Kent produziu alguma coisa, sob o pseudônimo “Joe Carter”.

Mas de volta a Disney, que é o tópico em questão aqui (e eu que não perco essa mania feia de sempre enfiar Stan Lee e cia na conversa, hein?), a primeira HQ de Siegel para a editora italiana Mondadori saiu em 1972, e se chama "Paperino e la macchina dell' Eroismo".
Os especialistas dizem que os enredos das HQs de Siegel pra Disney italiana, por vezes, lembravam bastante os de ficção científica que ele fazia pros gibis do Homem de Aço. Como por exemplo, a HQ "Paperino e la voce dal nulla", que mostra um super-herói alienígena moribundo agraciando Donald com o poder de vender qualquer tipo de coisa.

A arte ficou a cargo de Giorgio Cavazzano, um dos maiores artistas da “Bota”. Na opinião de Massimo Marconi, o chefão do departamento de roteiristas, Siegel enviava os roteiros envoltos em papel alumínio, via aérea. Os roteiros vinham completos, ou seja, com descrições detalhadas quadro a quadro, e com diálogos em inglês.
Daí, era traduzido para o italiano pela esposa de Marconi. Outros
artistas que desenharam suas histórias foram Guido Scala,
Romano Scarpa e Luciano Gatto.

Até 1979, o criador de Super-Homem escreveu 139 histórias para a revista semanal Topolino (Mickey) e mais algumas dezenas para a mensal Almanacco Topolino. E, de acordo com artigo publicado na edição 63 de Comic Book Marketplace (outubro de 1998), foram reprisadas às pencas em edições da I Classici Di Walt Disney. Geralmente, o que saía no título (considerado uma espécie de "The best of" da Disney), era traduzido para línguas diversas e republicado em outros países da Europa - principalmente Dinamarca e Alemanha.

Júlio de Andrade, que trabalhou durante anos na Editora Abril, me disse, que desse total, pelo menos cerca de 32 HQs Disney de Siegel foram publicadas por aqui, mas sem qualquer crédito ao autor. Na época era normal não se creditar os autores da Disney, capice? Mesmo o público leitor americano não sabia que algumas histórias de Siegel foram republicadas nos States via os gibis da Western/Gold Key.

Quem cuidava dessas adaptações para os outros países era o Studio Program, um “braço” da Disney americana no Velho Mundo, capitaneado por Mario Gentilini. Este, além de acumular a função de editor da Topolino, também tinha a incumbência de recrutar talentos para as revistas. Foi ele, portanto, quem viajou pra Califórnia em 1971 para “contratar” Siegel. Digo assim, pois na verdade, fizeram um "acordo de cavalheiros", aparentemente, sem nenhum papel assinado. Por coincidência ou não, assim que Gentilini se aposentou, Siegel parou de escrever pra Mondadori. A última HQ publicada, saiu em Topolino 1257, intitulada "Topolino e il fantasma della valle".
Bem, caso tenha se interessado em correr atrás desse material de Siegel, na referida edição da CBM há uma listagem das histórias em inglês. Se não achar esse magazine por aí, você pode ainda acessar o site Inducks (http://inducks.org/) – o maior banco de dados mundial de quadrinhos da Disney, ou a versão tupiniquim, o blog Inducks Brasil: http://inducks.blogspot.com/, sob o comando do quadrinista Fernando Ventura, e se esbaldar.

Pois é, todo esse papo a respeito de ratos, patos e italianos acabou me dando vontade de ler uns gibis velhos da Disney que tenho por aqui. Então, com licença, que está na hora de ir pro “alto e avante”...

Hã... o que eu quis dizer é que está na hora de dizer “Quac!”...
© Copyright Roberto Guedes

Comentários

Bira disse…
HAuhaauhauhuahauha!
Muito bom, Guedão.
Eu também não gostava de Disney.
Só lia quando ia pra Sampa no fim de ano, visitar a família.
Lá no Rio eu só lia Super-herói, Brucutu, Ferdinando e Asterix.
Mas na casa da minha tia Lulu e meu tio Lula (ops... Olê, olê, olê, olá, Lula, Luláááá!), eles adoravam Mauricio de Souza e Disney.
Aí eu lia, né?
HAuhauahuahahhaahuahuah
Mas adoorava o Zorro que o Zalla desenhava e as vezes aparecia no gibi, além das páginas de curiosidades da Vida Animal, super bem desenhadas!
Anônimo disse…
Puxa vida, Guedão! Sempre fui legal com você. Sempre te tratei com o maior respeito. E aí você me faz isto?
Primeiro diz que não gosta de gibis Disney.
Depois, meio que pra se redimir (redimir?), me vem comentando sobre os italianos?
Sacanagem!!!!

Cesar
Roberto Guedes disse…
C-calma, C-cesão... e-eu não disse que n-não gosto. Só f-falei que não curtiaaaaaargh...

Alô, Bira, aqui é o Meteoro. O Guedes sumiu, cara. Tá sabendo se rolou alguma coisa? Vi um senhor grisalho e de boina - aparentemente distinto -, saindo daqui. Será que... nah...
Anônimo disse…
Seguinte, Guedão, meu grande amigo:
Tudo bem que você não gostava (ops, digo, "não curtia") dos quadrinhos Disney, porém (e aqui vai meu comentário, agora sério e sem gozação, tá?) é preciso separar o que é "original" do que não é.
Pra mim e pro meus colegas que curtiram a época de ouro Disney, "originais" são:
Barks, Murry, Strobl, Bradbury, Alvarado, Savage e outros, lamentavelmente nunca creditados naquelas revistas (diferentemente dos seus ídolos que sempre foram creditados).
O traço desses caras acima citados era tão bom quanto o de seus admirados (que eu também admiro, diga-se de passagem). OK?
Era o que eu tinha a dizer.
Abraços

Cesar
Anônimo disse…
Nunca fui muito de Disney também, mas fiquei curioso pra conhecer essas histórias do Siegel. Sempre instigando a curiosidade da gente, né Guedão?
Rogério
Anônimo disse…
Qual o problema do Guedão não gostar de Disney? Aliás, ele só disse que não era fã, certo? Eu gosto de Disney, tenho centenas de revistas do Mickey, Pato Donald oscambau e nem por isso me ofendi com esse texto. Aliás, texto "super-duca", como diria o próprio Guedes.
Guedão, é o seguinte: bota o meu nome no próximo artigo que você fizer. Ficarei honrado. E me passa a lista das histórias do Siegel, que essa, cumpade, eu não sabia.
Leonardo
Anônimo disse…
Cara, você é um arqueólogo dos quadrinhos perdidos! Boa essa do Jerry Topolino Siegel!
Gabriel Rocha
Anônimo disse…
Parabens, Guedes. Fabuloso artigo e descoberta. Esta é bestificante...você foi longe... mas divertido mesmo é ler os seus textos.
Também não gostava da Dinsey (nem gosto) mas gostei de uma fase do Mickey e Superpateta...
Aquela fase em que Mickey é detetive, e é desenho infantil, com os outros personagegens desenhados pelo Dan Spiegle é clássica...
Abraço.
Franco
JJunior616 disse…
"Eu nunca fui fã da Disney!"

Pecou eim Guedes! rssss

Já eu prefiro a Turma da Monica, acho o gibi mais legal!
Roberto Guedes disse…
Pode crer, Júnior. Vão mandar os Irmãos Metralha me pegar. rs

Valeu, Franco! Também curtia essas HQs do Mickey detetive. Aliás, são as que eu mais gosto na Disney.

Leonardo, Cesão, paz na Disneylândia, por favor! rsrs
Anônimo disse…
"Cesão" (posso te chamar assim?), se você é amigão do Guedes, e acredito que seja, caso contrário ele não o citaria no texto, acho que você deveria estar habituado aos "meandros" do texto dele, tão cheios de "armadilhas" e "labirintos". Haja vista a frase que destaco aqui: "Mas eu não tinha a perspicácia pra sacar que Carl Barks era o cara."
Quase passou batida em minha primeira leitura também. Fixei-me mais na "revelação" de que Guedes não era fã de Disney, e só depois é que reparei na sua mea culpa quanto ao Barks. E ainda no final, ele diz que vai correr pra ler os Disney que tem em casa, brincando com o "Quac" do Donald e com a frase de Superman, de Siegel.
Genial, só pra variar.
Carlos
Roteiros envoltos em papel alumínio? Agora eu fiquei encafifado...
Anônimo disse…
Guedão,

Como assim: "Nunca fui fã de Disney", ô herege escritor???

"- Alô, é o Mancha? Seguinte ... preciso encomendar um servicinho prá ti ... é, em Sampa ... não, por telefone não vai dar prá explicar ... mas eu já falei com o Bafo e ele vai te contactar, OK? Não, não ... não é prá 'apagar' ninguém ... é só para dar uma chegada mais forte. Ó, tá ouvindo esse ruido na linha? Acho que tão tentando rastrear a ligação, deixa eu desligar. Depois a gente conversa ... tchau!"

Mas maravilha de texto, Guedão, como sempre ... :o)))

Abração.
Anônimo disse…
Ops ... esqueci de assinar o texto acima ...

Ahahahahah ...

Paulo Ricardo
jeanokada disse…
Ótimo texto, Guedes!

Eu também não curtia Disney quando criança. Só fui simpatizar com esse material muitos anos depois, já adulto, quando também vi que Barks era "o cara". Não virei fã de Disney, mas gosto de alguns personagens e autores. Na verdade acho que não sou fã de gênero nenhum - o meu olhar se dirige mais pra histórias e autores; por exemplo, não sou fã de super-heróis, mas gosto do Home-Animal, Patrulha do Destino e Grandes Astros Superman.

Turma da Mônica é até hoje um negócio que eu acho visualmente mais "agradável" que Disney, mas só fui efetivamente leitor da Mônica quando estava na primeira série. Eu estava aprendendo a ler e só podia encara textos mais simples. Mas naquela época as escolas públicas eram ótimas, e antes de terminar a primeira série eu já estava alfabetizado. Aí, de 7 pra 8 anos, dei adeus à Mônica e fui ler os gibis que mais me interessavam: terror. Dez em quando, Tarzan e Fantasma.

Talvez por causa disso eu até hoje fico meio confuso quando se fala de "quadrinho infantil". Geralmente se associa "infantil" com "bonequinhos e histórias simples", mas os gibis da minha infância (e outros amigos meus) foram os de terror.
Gerson_Fasano disse…
Eu sou suspeito para falar de Disney, sempre gostei e continuo gostando. Muito por influência dos meus pais que compravam essas revistas, mas me lembro perfeitamente de ler umas 500 vezes o Disney Especial 2 e 3 (sendo o 2 sensacional), de brincar na sala da minha casa com meu irmão e minha mãe com a primeira versão da Disneylândia, e outras.

Claro que gosto e opinião são iguais a boca, cada um tem a sua, mas espera aí que vou dar um telefonema.

- Alô, Mercenário ? Tenho um servicinho para você. É um carinha que já publicou 3 livros e blá blá blá....
Roberto Guedes disse…
Pronto... se não bastassem os vilões da Disney pegarem no pé, agora até os da Marvel estão em meu encalço. rs Paulão, Gérson, obrigado pela participação divertida!

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Jean, interessante análise essa sua. Em alguns pontos até combinamos.

Abração a todos!
Anônimo disse…
Muito legal Guedes.
Não sabia de nada disso que você escreveu. Sempre tive uma imagem do Siegel como um escritor meio fraquinho, mas é só impressão, pois li muito pouco dele. Mas agora sabendo dessa fase dele começo a mudar de opinião.
Abraço.
Andre Bufrem